Rogérião dá entrevista à Folha

4/26/2014 , 0 Comments

Torcedores de clubes do interior falam da relação de amor com seus times, centenários ou quase, mas que jamais celebraram grandes conquistas (Por Lucas Reis).

Um professor de música da USP de Ribeirão Preto simplifica uma das maiores indagações da humanidade. "Sabe o que é a vida? A vida é o passatempo entre dois jogos do Comercial", diz.

E pensar que os corintianos adoram dizer que são sofredores. Mas, francamente, no futebol tortura não é encerrar o tão aguardado ano do centenário sem títulos, e sim atravessar um século inteiro sem conquistas de destaque no Estado, muito menos nacionalmente.

"Torcer pelo Comercial significa exclusivamente amor à camisa, não importando onde esteja o time", afirma Rubens Ricciardi, 46, o professor de música apaixonado por um clube que comemora cem anos em 2011 e que nunca lhe deu nenhuma grande conquista em campo.

Como ele, o interior de SP tem uma série de exemplos de "sofrimento" aliado a amor à camisa. A Folha conversou com quatro dos mais fanáticos torcedores de Comercial, Rio Branco, Ponte Preta e Rio Claro: todos tradicionais, com cem anos ou quase, torcidas apaixonadas e nenhum título importante.

Em comum, declarações de amor incondicional. "Há uma relação afetiva e prazerosa de ir ao [estádio] Palma Travassos, ficar no alambrado e ver o Comercial."

Ricciardi explica de onde vem tanto amor. "Sou um sujeito que torço para o time da minha cidade. Não tenho essa ilusão de comprar um produto que passa na televisão. Quem é de Ribeirão e torce para um time da capital é apenas um consumidor à distância, não tem identidade."

Mas é difícil desvendar a receita -se é que ela existe- para se idolatrar um time que nunca ganha nada.

"É uma coisa até difícil de explicar. O amor que nós temos pelo Rio Branco é muito grande", conta o representante comercial Rogério Lopes (foto Mateus Bruxel/Folhapress), 38 anos, todos dedicados ao clube que em 2011 completará 98 anos, sem nenhum título relevante.

Lopes contabiliza alguns "frutos" de sua devoção. "Já larguei três mulheres por causa do meu time. Fiquei sete anos seguidos sem perder um único jogo do Rio Branco, dentro e fora de casa. Tenho orgulho de ser Rio Branco."

Talvez apenas uma expressão poderia explicar o tamanho do fanatismo da aposentada Iracy Troques Franzomi, 73, pelo Rio Claro, que completará 102 anos em 2011.

"Virgem Maria! Eu acompanhei o Rio Claro por todo o interior do Estado até pela quarta divisão. Conheço todos os estádios de São Paulo", diz a famosa dona Iracy. Ela se orgulha de ter costurado em sua máquina uma bandeira gigante do clube.

A paixão, conta, começou com o marido. "Quando me casei, ele era rio-clarista fanático. Peguei gosto pelo time, passei a acompanhar, ia a todos os jogos. Agora, por causa da minha saúde, não estou acompanhando muito. No ano que vem, se Deus ajudar, ele vai voltar para a Série A-1", conta a aposentada.

"Já tive muitas alegrias com o Rio Claro. Mas hoje eu posso dizer que sou uma sofredora. A situação do time é muito ruim", relata.

Mas dor de verdade provou o músico Jorginho Araújo, 52. "Foi a maior agulhada que eu já senti como torcedor da Ponte Preta", afirma ele, que tinha 19 anos quando viu o Corinthians vencer a Ponte por 1 a 0 no famoso Campeonato Paulista de 1977. "Peguei um ônibus sozinho e fui parar no Morumbi. Chorei feito criança", conta.

"Como sou músico, no dia seguinte, ainda em São Paulo, fui tocar no Círculo Militar. E quem estava presente? Ninguém menos do que o árbitro da partida, o Dulcídio [Wanderley Boschilia]. A Ponte foi usurpada naquele jogo. Nem a seleção brasileira ganharia do Corinthians."


Araújo compôs uma série de canções para a equipe campineira, entre elas o hino ao centenário, completado em 2000. "Sofredor? Não, não me deixo levar por este lado. Já sofri muito, já derrubei muitas lágrimas. Mas a paixão pela Ponte é superior a qualquer coisa."

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